A palavra câncer vem do grego karkínos, que significa caranguejo (Figura 1) e foi utilizada pela primeira vez por Hipócrates, o pai da medicina (Figura 2), que viveu entre 460 e 377 a.C. . É uma referência à proliferação de células cancerosas no organismo (metástases) que se espalham pelo corpo como as patas e pinças do caranguejo se irradiam a partir do seu cefalotórax que representa o tumor.
O câncer não é uma doença nova. O fato de ter sido detectado em múmias egípcias comprova que ele já afetava o homem há mais de 3 mil anos antes de Cristo. Médicos do Egito antigo (3000 a.C.) registraram doenças que, dadas suas características, provavelmente podiam ser classificadas como câncer. Hipócrates (377 a.C.) também descreveu enfermidades que se assemelhavam aos cânceres de estômago, reto, mama, útero, pele e outros órgãos. Portanto, a presença de neoplasias malignas na humanidade já é conhecida há milênios. No entanto, registros que designam a causa das mortes como câncer passaram a existir na Europa apenas a partir do século XVIII. Desde então, observou-se o aumento constante nas taxas de mortalidade por câncer, que parecem acentuar-se após o século XIX, com a chegada da industrialização.
As células normais que formam os tecidos do corpo humano são capazes de se multiplicar por meio de um processo contínuo que é natural. A maioria das células normais cresce, multiplica-se e morre de maneira ordenada, porém, nem todas são iguais: algumas nunca se dividem, como os neurônios; outras, como as células do tecido epitelial, dividem-se de forma rápida e contínua. Dessa forma, a proliferação celular não implica necessariamente presença de malignidade, podendo simplesmente responder a necessidades específicas do corpo.
É importante distinguir “câncer” de “tumor”. Este último é um termo genérico que indica aumento ou crescimento anormal de um tecido. Pode ser originado por um processo inflamatório, por uma neoplasia benigna ou por uma neoplasia maligna (câncer), ou seja, a presença de um tumor não significa que seja um câncer.
Classificação das neoplasias
A neoplasia é uma proliferação anormal do tecido, que foge parcial ou total- mente ao controle do organismo e tende à autonomia e à perpetuação, com efeitos agressivos sobre o homem. Neoplasias podem ser benignas ou malignas.
As neoplasias benignas e os tumores benignos têm seu crescimento de forma organizada, geralmente lento, expansivo e apresentam limites bem nítidos. Apesar de não invadirem os tecidos vizinhos, podem comprimir os órgãos e os tecidos adjacentes. O lipoma (que tem origem no tecido gorduroso), o mioma (que tem origem no tecido muscular liso) e o adenoma (tumor benigno das glândulas) são exemplos de tumores benignos. As neoplasias malignas ou os tumores malignos manifestam um maior grau de autonomia e são capazes de invadir tecidos vizinhos e provocar metástases, podendo ser resistentes ao tratamento e causar a morte do hospedeiro.
Atualmente, câncer é o nome geral dado a um conjunto de mais de 200 doenças, que têm em comum o crescimento desordenado de células (Figura 3), que tendem a invadir tecidos e órgãos vizinhos. É uma doença caracterizada por uma população de células que cresce e se divide de forma desordenada, sem respeitar os limites normais, invadindo e destruindo os tecidos à sua volta. Essas células ainda podem se espalhar para lugares distantes no corpo, através da corrente sanguínea ou dos vasos linfáticos, processo denominado metástase. Estas propriedades malignas do câncer o diferenciam dos tumores benignos que são auto-limitados em seu crescimento, não invadem tecidos adjacentes e não produzem metástases (embora alguns tumores benignos sejam capazes de se tornarem malignos). Pode também ser chamado de neoplasia maligna.
Câncer in situ e câncer invasivo
O câncer não invasivo ou carcinoma in situ é o primeiro estágio em que o câncer pode ser classificado (essa classificação não se aplica aos cânceres do sistema sanguíneo). Nesse estágio, as células cancerosas estão somente na camada de tecido na qual se desenvolveram e ainda não se espalharam para outras camadas do órgão de origem. A maioria dos cânceres in situ é curável se for tratada antes de progredir para a fase de câncer invasivo.
No câncer invasivo, as células cancerosas invadem outras camadas celulares do órgão, ganham a corrente sanguínea ou linfática e têm a capacidade de se disseminar para outras partes do corpo. Essa capacidade de invasão e disseminação que os tumores malignos apresentam de produzir outros tumores, em outras partes do corpo, a partir de um já existente, é a principal característica do câncer. Esses novos focos de doença são chamados de metástases.
Cada tipo de câncer apresenta causas, evolução, agressividade, sintomas e tratamentos particulares. O câncer pode afetar pessoas de todas as idades, mas o risco para a maioria dos tipos de câncer aumenta com o avanço da idade. Cerca 13% de todas as mortes no mundo são devido ao câncer, sendo pulmão, estômago, fígado, cólon e mama os que mais matam.
Oncogênese
O processo de formação do câncer é chamado de carcinogênese ou oncogênese e, em geral, acontece lentamente, podendo levar vários anos para que uma célula cancerosa prolifere-se e dê origem a um tumor visí- vel. Os efeitos cumulativos de diferentes agentes cancerígenos ou carcinógenos são os responsáveis pelo início, promoção, progressão e inibição do tumor. A carcinogênese é determinada pela exposição a esses agentes, em uma dada frequência e em dado período de tempo, e pela interação entre eles. Devem ser consideradas, no entanto, as características individuais, que facilitam ou dificultam a instalação do dano celular.
Esse processo é composto por três estágios:
Estágio de iniciação, no qual os genes sofrem ação dos agentes cancerígenos.
Estágio de promoção, no qual os agentes oncopromotores atuam na célula já alterada.
Estágio de progressão, caracterizado pela multiplicação descontrolada e irreversível da célula.
Agentes cancerígenos
A presença dos agentes cancerígenos, por si só, não pode ser responsabilizada pelo desenvolvimento dos tumores. Há, porém, casos em que isso acontece. Sabe-se que a exposição prolongada à substância química benzina pode aumentar o risco de produzir câncer na bexiga (principal tipo de câncer encontrado em trabalhadores das antigas indústrias de tintas, couros, borracha e papel que utilizavam benzina na sua fabricação) e o câncer de pulmão, que ocorre entre fumantes, em mais de 90% dos casos é consequência do tabagismo crônico.
Esses dois exemplos remetem a dois conceitos utilizados na epidemiologia: causa necessária e causa suficiente, em que, para que um indivíduo desenvolva uma doença, não basta a presença do agente específico da doença em seu organismo. É necessário que, sobre o indivíduo, atuem outras forças (ou causas) capazes de, em conjunto com o agente específico, provocar a doença.
O agente específico é a causa necessária. As outras forças são ditas causas predisponentes. Causa necessária e causas predisponentes formam a causa suficiente. Assim, as doenças multicausais, como o câncer, podem ter distintas causas suficientes.
A EVOLUÇÃO DOS TUMORES
O conhecimento da forma como evoluem ou crescem alguns tumores permite que eles sejam previstos ou identificados quando a lesão ainda está na fase pré-neoplásica, ou seja, em uma fase em que a doença ainda não se desenvolveu.
A evolução do tumor maligno depende:
Da velocidade do crescimento tumoral.
Do órgão em que o tumor está localizado.
De fatores constitucionais de cada pessoa.
De fatores ambientais etc.
Frente a essas características, os tumores podem ser detectados em diferentes fases:
Fase pré-neoplásica (antes de a doença se desenvolver).
Fase pré-clínica ou microscópica (quando ainda não há sintomas).
Fase clínica (apresentação de sintomas).
Em geral, as neoplasias malignas são classificadas e denominadas de acordo com o órgão ou tecido onde surgiram (p.ex. câncer de mama, pulmão, estômago, etc). Linfoma é o câncer que se desenvolve no sistema linfático, enquanto a leucemia envolve os glóbulos brancos do sangue (leucócitos). Quando um câncer invade tecidos ou órgãos distantes (metástases), ele geralmente permanece com as características celulares do tumor primário (inicial) e são chamados pelo nome do tumor primário acrescido da palavra metastático. Por exemplo, um câncer de intestino grosso (cólon) que desenvolve um nódulo no fígado, passa a ser chamado de câncer de cólon metastático. O diagnóstico definitivo de neoplasia maligna geralmente requer exame anatomo-patológico que consiste na análise de uma amostra por um patologista do tecido doente, ou seja, uma biópsia. A maioria dos tumores malignos pode ser tratada e alguns curados, dependendo do tipo específico, localização e estadiamento (estágio da doença). Uma vez diagnosticado, o câncer pode ser tratado por cirurgia, quimioterapia ou radioterapia, e em alguns casos, através da combinação destas modalidades de tratamento. Com o desenvolvimento das pesquisas, os tratamentos estão se tornando cada vez mais específicos para as diferentes variedades do câncer. Ultimamente tem havido um progresso significativo no desenvolvimento de medicamentos que agem especificamente em anomalias moleculares detectáveis em certos tumores, minimizando o dano às células normais. O prognóstico para os pacientes com câncer é muito influenciado pelo tipo de câncer, assim como o estadiamento. Além disso, a graduação histológica e a presença de marcadores moleculares específicos podem também ser úteis em estabelecer o prognóstico, assim como em determinar tratamentos personalizados.
Os tipos de câncer mais incidentes (exceto pele não melanoma), por localização primária e gênero, esperados para 2018/2019, no Brasil, são:
Homens: próstata, cólon/reto e pulmão.
Mulheres: mama, cólon/reto, colo do útero.
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